Sexo pós-parto: tudo que você precisa saber antes de voltar a transar

Vinicius de Araujo
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Não é novidade que o corpo e a vida mudam muito depois da chegada de um bebê. Em meio a noites mal dormidas, pausas recorrentes para a amamentação, hormônios a mil e novas responsabilidades, outros setores são colocados em pausa. Por exemplo, a vida sexual, que também é afetada por essa transformação – em partes porque, de fato, há necessidade de ter cautela e resguardos quando pensamos em sexo pós-parto.

No Brasil, diversos estudos mostram que mais da metade das mulheres têm algum tipo de disfunção sexual durante o puerpério, enquanto 70% relatam dificuldades. Nos primeiros seis meses depois de dar à luz, as queixas mais comuns são de dor na penetração (dispareunia, na literatura médica) e queda da libido.

Não é só o corpo e a rotina que mudam. Há ainda um impacto mental e social. "Em alguns casos, a mulher começa a se enxergar de outra forma, com outro papel, de mãe. Isso pode gerar uma necessidade de adequação, junto de um sentimento de culpa por não se permitir vivenciar a sexualidade da maneira como vivenciava", diz Ligia Santos, ginecologista, obstetra e assessora da Área Técnica da Saúde da População Negra de São Paulo.

Marie Claire conversou com Santos e a sexóloga Camila Gentile para contar tudo o que você precisa saber sobre sexo pós-parto e como manter esse momento prazeroso e seguro.

Só faça sexo-pós parto se você quiser. Caso contrário, é violência

Antes de seguirmos em frente, um aviso importante: cada experiência é única. E por mais que sexo seja muito gostoso e uma forma de conexão entre casais, ele pode tranquilamente ficar para depois. O ideal, sempre, é que quem deu à luz siga o próprio ritmo e tenha seus desejos totalmente respeitados e vistos com empatia.

Infelizmente, muitas mulheres acabam desrespeitando o resguardo ou as próprias vontades devido a pressões do namorado, marido ou companheiro. Isso quando não sofrem uma violência que tem nome: estupro no resguardo. O Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) mostra que, a cada 40 minutos, uma mulher sofre violência sexual pelo cônjuge.

Entre 2012 e 2022, cônjuges ou namorados foram os autores de um a cada oito estupros de mulheres no Brasil, diz o Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan). Isso quer dizer que mais de 42 mil dos 350 mil estupros cometidos no período entram na definição de estupro marital. Na base de dados, não há dados específicos sobre violência no resguardo.

“Sexo tem que ser algo prazeroso, e é preciso aprender a respeitar o limite do outro. É importante que haja cumplicidade e respeito. Os homens não estão diante de uma máquina, mas de uma mulher que teve um bebê, com inúmeras demandas. Os homens fazem parte do processo, o que também significa saber esperar”, diz Ligia Santos. “As mulheres precisam ser ouvidas, se sentir protegidas, compreendidas, desejadas e estimuladas no ponto certo para quererem sexo. Se ainda não estão prontas, o ‘não’ basta", completa Camila Gentile.

O que é resguardo e quanto tempo dura?

O parto deixa diversos impactos no corpo, que vão de pontos e lacerações a lesões. Antes de cogitar voltar a transar, é obrigatório respeitar um período de resguardo até que o corpo se recupere. Essa é uma indicação que não depende, por exemplo, se o parto foi normal ou cesárea ou se a gravidez foi de risco: todo mundo precisa cumprir.

Santos explica que o resguardo consiste em não ter qualquer tipo de relação sexual, seja com penetração ou não. Ou seja, sexo anal ou vaginal estão fora de cogitação e só podem acontecer depois da cicatrização completa. A ginecologista também recomenda evitar masturbação e sexo oral, mas libera desde que o estímulo seja feito muito devagar, sem atritos e com cuidado.

E quanto tempo dura o resguardo pós-parto? Profissionais de saúde recomendam que o tempo seja entre 40 a 60 dias, por mais que não exista um consenso. Camila Gentile afirma que pode levar até 120 dias para que o corpo se recupere por completo. Mas lembre-se sempre de que cada recuperação tem seu próprio ritmo.

"Se a gestante teve uma gravidez de risco por uma hipertensão que voltou ao normal, ela fica dentro do protocolo de qualquer outra mulher. Agora, se ela teve algum tipo de sequela, precisou de uma intervenção maior, talvez o resguardo dure mais tempo. Essa é uma questão avaliada caso a caso”, diz Santos.

Como o parto impacta a vida sexual

Além da necessidade de recuperação do corpo, a amamentação também interfere no desejo sexual. Santos explica que a produção de leite só acontece por conta de um hormônio chamado prolactina, que causa ressecamento na vagina e diminui a libido. Se você experimentar dificuldades como fissuras nas mamas, empedramento de leite ou mastite, as dores ficam mais intensas.

A liberação de prolactina também diminui a lubrificação na vagina, outra queixa muito comum quando se fala em sexo pós-parto. Nos casos de parto natural, algumas mulheres podem sentir que o canal está mais elástico, largo e fraco. A ginecologista explica que isso pode, sim, acontecer, mas são questões temporárias. “Tudo isso dura em torno de seis meses, que é quando a amamentação está mais intensa”, afirma.

“A mama também fica muito sensível nesse período, principalmente nos primeiros dois meses. Conforme isso passa, a mulher vai se sentindo mais confortável para fazer sexo e, muito provavelmente, não vai ter mais essa sensibilidade”, complementa Santos.

Quando procurar um médico?

A ginecologista recomenda buscar um profissional de saúde quando as dores persistirem, a qualquer momento depois do fim do resguardo. Ou ainda: se você perceber que ficou insegura para voltar a transar por questões como sensação de incontinência urinária.

“Após um mês do período do resguardo é para estar tudo bem. Se isso não acontecer, é preciso verificar se o ponto se fechou ou se houve fissura, se machucou, se o canal está muito ressecado ou se há outras interferências”, pontua Santos.

Nestes casos, o profissional faz um exame físico para checar se está tudo em ordem. Se não existirem alterações, Santos recomenda manter a paciência, buscar relaxar, apostar em um bom lubrificante e tentar se soltar aos poucos. No caso de alterações, há tratamentos com medicamentos ou procedimentos. Se as dores persistirem por um ano, a ginecologista indica incluir acompanhamento psicológico.

É possível engravidar no puerpério?

Outra dúvida e receio comum relacionado ao sexo pós-parto é se há possibilidade de engravidar durante o puerpério. A resposta varia de acordo com o momento do puerpério que está sendo vivido, segundo Santos.

Segundo a ginecologista, as chances de uma nova gestação são muito pequenas em até 40 dias. Também diz que a amamentação exclusiva e frequente tende a ser adotada como método contraceptivo. Isso porque a produção de prolactina diminui os hormônios responsáveis pela ovulação. Por mais que este não seja um método muito eficaz, a médica afirma que funciona desde que se mantenha a constância e exclusividade.

A partir do sexto mês, ao fim da amamentação, as chances de engravidar normalmente ficam maiores. Neste caso, o melhor é recorrer aos métodos contraceptivos, como pílula anticoncepcionalpreservativosDIUs, diafragmas e muito mais.

Santos indica que essa é uma etapa importante para que seja possível que o corpo da mulher descanse. “A gestação é um evento que é normal, mas consome muito do corpo, assim como o pós-parto. Os cuidados que um bebê recém-nascido deve ter consomem muito a mulher. Por isso, o planejamento familiar é fundamental.”

O resguardo acabou e quero voltar a transar. E agora?

Se o período de resguardo obrigatório passou e você estiver se sentindo segura e muito afim de retomar o sexo, não vá com muita sede ao pote no início. A retomada precisa ser feita com cuidado e atenção redobrada.

“Recomendo muito o uso de lubrificantes de preferência com ativos como ácido hialurônico que podem ajudar a hidratar mais a região íntima”, diz Camila Gentile. Santos também recomenda hidratantes vaginais e lubrificantes à vontade, “de preferência à base de água, que tem menos fator irritante.”

Gentile também recomenda os excitantes térmicos, com efeito de esfriar ou esquentar, para ajudar a sensibilizar a região íntima. “Procurem um tempo para ficar a sós e investir no tempo de namoro, como transar em lugares fora de casa. Também recomendo que busquem sex toys. O vibrador pode ser um coadjuvante maravilhoso para apimentar e equilibrar os estímulos”, indica a sexóloga.

Mas a principal forma de retomar essa conexão é manter uma conexão aberta e franca. Para mulheres, às vezes um estímulo que antes era prazeroso pode ter mudado, e o parceiro precisa ser comunicado – afinal, a transa tem que ser boa para ambos. Também não tenha vergonha de falar que não chegou ao orgasmo ou que não se sente excitada.

A criatividade também é primordial. “Muitas vezes, esse sexo vai acontecer num período muito curto em que a criança estiver dormindo, por exemplo. O bom diálogo vai ajudar a aproveitar e relaxar, e contribui para que essa relação seja prazerosa”, diz Santos.

“O sexo é muito amplo, e existem várias formas de fazer, sem necessariamente pensar em transa com pênis ou vagina. Não é preciso ficar pensando numa retomada somente na questão da penetração e posições mais tradicionais. Tem que ser criativo para poder aproveitar”, aconselha a médica.

Fonte: Revista Marie Claire

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